Pré-Eclâmpsia na gravidez: entenda os sinais, riscos e cuidados essenciais
- equipematernalis
- 17 de out.
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A gravidez é um período de profundas transformações, expectativas e alegrias. No entanto, é também um momento que pode trazer muitas dúvidas e preocupações sobre a saúde da mãe e do bebê. Entre as condições que exigem atenção especial, está a pré-eclâmpsia. Longe de ser um motivo para pânico, a pré-eclâmpsia é uma condição que, quando compreendida e acompanhada de perto, pode ser gerenciada com segurança. A informação clara e confiável é a principal aliada da gestante e de sua família nesta jornada.
O que é Pré-Eclâmpsia?
A pré-eclâmpsia é uma complicação grave e específica da gestação, caracterizada pelo surgimento de pressão arterial elevada após a 20ª semana de gravidez, em uma mulher que anteriormente possuía pressão arterial normal. Classicamente, esse aumento da pressão arterial vem associado à perda de proteína pela urina, um quadro conhecido como proteinúria, que sinaliza um possível comprometimento da função dos rins.
O diagnóstico de pré-eclâmpsia pode ser estabelecido mesmo na ausência de proteinúria, caso a hipertensão esteja acompanhada de outros sinais de disfunção. Isso pode incluir alterações nas plaquetas, disfunção do fígado ou dos rins, edema agudo de pulmão, ou sintomas neurológicos como dores de cabeça intensas ou alterações visuais. Essa visão mais ampla revela a pré-eclâmpsia como uma síndrome multissistêmica, ou seja, uma condição que afeta múltiplos sistemas do corpo, e não apenas a pressão arterial.
Gravidade e o impacto no Brasil
Globalmente, a condição afeta entre 1,5% e 16,7% das gestações, resultando em dezenas de milhares de mortes maternas anualmente. No Brasil, a situação é particularmente preocupante: as síndromes hipertensivas, com a pré-eclâmpsia em destaque, são uma das principais causas de mortalidade materna e de complicações perinatais, como o parto prematuro. Esse cenário reforça a urgência de disseminar informações de qualidade para que o diagnóstico precoce e o manejo adequado se tornem uma realidade para todas as gestantes.
Diferenciando Pré-Eclâmpsia de Eclâmpsia e Hipertensão Gestacional
Para um entendimento completo, é importante distinguir a pré-eclâmpsia de outras condições hipertensivas da gravidez:
Hipertensão Gestacional: É o diagnóstico dado quando a pressão arterial se eleva após a 20ª semana de gestação, mas sem a presença de proteinúria ou outros sinais de disfunção de órgãos. Embora seja uma condição mais branda, exige vigilância, pois cerca de 25% das mulheres com hipertensão gestacional podem evoluir para um quadro de pré-eclâmpsia.
Eclâmpsia: Representa a complicação mais temida e grave da pré-eclâmpsia. Ocorre quando a doença progride e a gestante apresenta convulsões generalizadas. A eclâmpsia é uma emergência médica que coloca em risco imediato a vida da mãe e do bebê.
Fatores de Risco: quem precisa de atenção redobrada?
Para facilitar a avaliação clínica, organizações de saúde como o ACOG e a FEBRASGO utilizam um modelo prático. Segundo esse modelo, a indicação para iniciar medidas preventivas se dá quando a gestante apresenta pelo menos um fator de alto risco ou dois ou mais fatores de risco moderado. O exame de ultrassom que identifica o risco de pré-eclâmpsia, sozinho, não definirá a conduta.
Sinais de alerta: quais sintomas não devem ser ignorados?
Uma das características mais perigosas da pré-eclâmpsia é que, em seus estágios iniciais, ela pode ser completamente assintomática. A gestante pode se sentir perfeitamente bem enquanto sua pressão arterial sobe a níveis perigosos.
As medições de rotina da pressão arterial e a análise de urina em cada consulta são as ferramentas mais eficazes para a detecção precoce, antes mesmo do surgimento de qualquer sintoma perceptível.
Sinais e sintomas que exigem atenção
Embora a doença possa ser silenciosa, alguns sinais podem surgir e devem ser comunicados imediatamente à equipe de saúde:
Inchaço (edema): É normal que gestantes apresentem um certo grau de inchaço nos pés e tornozelos, especialmente no final do dia. O sinal de alerta para a pré-eclâmpsia, no entanto, é um inchaço súbito e excessivo, que não melhora com o repouso e afeta principalmente o rosto e as mãos.
Ganho de peso rápido: Um aumento de peso abrupto, como mais de 1kg em uma única semana, pode ser um indicativo de retenção de líquidos generalizada, um dos sinais da doença.
Dor de cabeça forte e persistente: Uma dor de cabeça que não cede com analgésicos comuns e que é descrita como latejante ou em pressão, diferente de dores de cabeça habituais. Este sintoma pode indicar que os vasos sanguíneos do cérebro estão sob estresse e há risco de edema cerebral.
Alterações na visão: Visão embaçada ou turva, sensibilidade incomum à luz, ou a percepção de "pontinhos brilhantes", "flashes de luz". Esses distúrbios visuais são causados por espasmos nas artérias da retina e pelo comprometimento do fluxo sanguíneo para o cérebro.
Dor na parte superior do abdômen: Uma dor intensa localizada "na boca do estômago" ou logo abaixo das costelas do lado direito. Esta dor é um sinal de alerta grave, pois pode indicar distensão e inflamação do fígado, um dos órgãos-alvo da doença.
Náuseas e vômitos intensos: Especialmente se surgirem de forma abrupta na segunda metade da gestação, não estando relacionados aos enjoos típicos do primeiro trimestre.
Dificuldade para respirar ou falta de ar: Uma sensação de respiração ofegante que surge mesmo em repouso pode ser um sinal de edema pulmonar, uma complicação grave onde há acúmulo de líquido nos pulmões devido ao aumento da permeabilidade dos vasos sanguíneos.
Diminuição do volume de urina: Urinar com menos frequência ou em menor quantidade do que o habitual pode ser um sinal de que os rins estão sendo afetados e sua função de filtragem está diminuindo.
O impacto da Pré-Eclâmpsia: riscos para a mãe e bebê
Eclâmpsia: é a progressão da pré-eclâmpsia para um quadro de convulsões, representando uma emergência obstétrica com alto risco de mortalidade.
Síndrome HELLP: Esta é uma das complicações mais graves e uma variação da pré-eclâmpsia. A sigla HELLP descreve suas características principais: Hemolysis (hemólise, ou destruição dos glóbulos vermelhos), Elevated Liver enzymes (elevação das enzimas do fígado, indicando dano hepático) e Low Platelets (baixa contagem de plaquetas, comprometendo a coagulação). A Síndrome HELLP pode evoluir rapidamente e levar à falência de múltiplos órgãos.
Danos a órgãos: A pré-eclâmpsia pode causar danos agudos e, por vezes, permanentes a órgãos vitais, como insuficiência renal aguda, insuficiência hepática e edema pulmonar. O risco de Acidente Vascular Cerebral (AVC), tanto hemorrágico quanto isquêmico, também é significativamente aumentado.
Descolamento Prematuro da Placenta (DPP): Em alguns casos, a placenta pode se separar da parede do útero antes do momento do parto. Isso pode causar sangramento intenso, colocando em risco a vida da mãe e interrompendo o fornecimento de oxigênio e nutrientes para o bebê.
Restrição de crescimento fetal: Como a placenta não funciona adequadamente, o fluxo de sangue, oxigênio e nutrientes para o bebê é reduzido. Isso pode impedir que o feto cresça e ganhe peso no ritmo esperado, uma condição conhecida como restrição de crescimento intrauterino.
Parto prematuro: Frequentemente, a única maneira de interromper a progressão da pré-eclâmpsia e proteger a saúde da mãe é realizar o parto, mesmo que o bebê ainda não esteja a termo. A prematuridade é uma das principais consequências da doença e traz consigo riscos associados, como dificuldades respiratórias e maior vulnerabilidade a infecções para o recém-nascido.
Sofrimento fetal e baixo peso ao nascer: A insuficiência placentária pode levar a uma diminuição do oxigênio disponível para o feto e, consequentemente, a um baixo peso ao nascer, o que aumenta os riscos de complicações no período neonatal.
É importante notar que a pré-eclâmpsia não é apenas um evento agudo da gravidez. Ela funciona como um marcador de risco para a saúde futura da mulher. O estresse vascular extremo imposto pela doença pode "revelar" uma predisposição subjacente a problemas cardiovasculares. Mulheres que tiveram pré-eclâmpsia apresentam um risco significativamente maior de desenvolver hipertensão crônica, doenças cardíacas e AVC ao longo da vida. Portanto, o cuidado não termina no parto; ele se estende para a necessidade de um monitoramento contínuo da saúde cardiovascular.
Diagnóstico e acompanhamento: o papel essencial do pré-natal
O pré-natal de qualidade é a principal estratégia de defesa contra os desfechos graves da pré-eclâmpsia. Como a doença pode progredir de forma silenciosa e rápida, cada consulta funciona como uma barreira de contenção, permitindo a detecção precoce e a intervenção antes que complicações sérias se instalem.
Como o diagnóstico é feito
O diagnóstico da pré-eclâmpsia baseia-se em uma combinação de achados clínicos e laboratoriais:
Aferição da pressão arterial: Este é o pilar do diagnóstico. Considera-se hipertensão quando a pressão arterial é igual ou superior a 140 mmHg por 90 mmHg, medida em pelo menos duas ocasiões com um intervalo mínimo de 4 horas.
Exame de urina (proteinúria): A análise da urina para detectar a presença de proteínas é o segundo pilar clássico. Isso pode ser feito por meio de uma fita reagente na própria consulta ou por uma análise mais precisa de uma amostra de urina de 24 horas.
Exames de sangue: São fundamentais para avaliar se a doença está afetando outros órgãos. Os exames verificam a contagem de plaquetas e os níveis de enzimas hepáticas (TGO/TGP) e de creatinina (que mede a função renal).
Uma vez que a suspeita de pré-eclâmpsia é levantada ou o diagnóstico é confirmado, o acompanhamento pré-natal se intensifica. As consultas tornam-se mais frequentes, e o monitoramento da saúde da mãe e do bebê é rigoroso.
Estratégias de prevenção para gestantes de alto risco
Para mulheres identificadas com alto risco, a medicina oferece intervenções baseadas em evidências sólidas:
Ácido Acetilsalicílico (AAS) em baixa dose: o uso diário de AAS em baixas doses (geralmente entre 100 mg e 150 mg), quando iniciado antes da 16ª semana de gestação e mantido até por volta da 36ª semana, pode reduzir a incidência de pré-eclâmpsia e suas complicações.
Suplementação de cálcio: Esta é uma estratégia de prevenção de altíssimo impacto, especialmente no Brasil. Em 2024, o Ministério da Saúde instituiu a suplementação universal de cálcio para todas as gestantes. A justificativa é dupla: primeiro, a suplementação de cálcio pode reduzir o risco de pré-eclâmpsia em até 55%; segundo, dados nacionais indicam que mais de 96% das mulheres brasileiras têm uma ingestão de cálcio inferior à recomendada.
Estilo de vida saudável: A manutenção de um estilo de vida saudável, com uma dieta equilibrada e a prática de exercícios físicos regulares, contribui para a saúde cardiovascular geral e é uma recomendação importante.
Manejo e tratamento após o diagnóstico
Uma vez que a pré-eclâmpsia é diagnosticada, o objetivo do tratamento é controlar os sintomas, prevenir a progressão para formas graves e prolongar a gestação com segurança até que o bebê atinja a maior maturidade pulmonar possível.
Medicamentos anti-hipertensivos: São utilizados medicamentos com o objetivo de controlar os níveis da pressão arterial e evitar picos perigosos que poderiam levar a um AVC.
Sulfato de Magnésio: Em casos de pré-eclâmpsia com critérios de gravidade, o sulfato de magnésio é administrado por via intravenosa. Este medicamento é o tratamento de escolha para a prevenção das convulsões (eclâmpsia) e para o tratamento da eclâmpsia já instalada.
A "cura" definitiva: o parto. É crucial entender que a única cura definitiva para a pré-eclâmpsia é o parto, pois a doença se origina na placenta. A decisão sobre o momento ideal para o parto é complexa e envolve um balanço cuidadoso entre os riscos para a mãe de continuar a gestação e os riscos para o bebê associados à prematuridade. A pré-eclâmpsia, por si só, não é uma indicação de cesariana. Se as condições maternas e fetais permitirem, a indução do parto para um nascimento vaginal é frequentemente uma opção mais segura e viável.
A gestante é a protagonista de sua saúde e do seu cuidado. Faça perguntas, tire dúvidas e compartilhe qualquer mudança que perceba em seu corpo. Com o monitoramento adequado e as intervenções corretas, a grande maioria das mulheres com pré-eclâmpsia tem desfechos positivos, com o nascimento de bebês saudáveis. Converse com seu médico/enfermeiro, participe ativamente de cada etapa do seu pré-natal e confie na equipe que a acompanha, mas não tenha medo de buscar outros profissionais quando se sentir insegura. Cuidar de você é a melhor e mais eficaz forma de cuidar do seu bebê!



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